segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

MARIE-DOMINIQUE CHENU (1895-1990)

Marie-Dominique Chenu, OP (1895-1990), foi teólogo francês com grande influência no Concílio Vaticano II. Nascido em Soisy-sur-Seine, França, a 7 de janeiro de 1895, e falecido a 11 de fevereiro de 1990, com 95 anos.

Entrou para a Ordem dos Pregadores em 1913 e concluiu os seus estudos, em Roma, em 1920, tornando-se professor no convento de Le Saulchoir. Especialista em história da Idade Média, foi efetuando também estudos teológicos. Um dos seus primeiros livros Une école de teologie (1937), foi em 1942 colocado no Index, o índice dos livros proibidos da Igreja Católica. Soube da notícia pela rádio e profundamente afeta, tanto mais que era superior do seu convento, nessa mesma noite demitiu-se do seu cargo directamente ao arcebispo de Paris, que lhe disse para ter calam, pois «dentro de 20 anos todos falaremos como você». Depois da II Grande Guerra, entre 1946 e 1952 foi professor na Universidade da Sorbone, em Paris. Reabilitado, ainda que não de forma completa, pois apenas pode participar no Concílio Vaticano II como consultor de um bispo de Madagascar, veio a ser reconhecido como um dos mais influientes teólogos do século XX.

Foi diretor do Bulletin thomiste de 1924 a 1934; diretor da Revue des sciences philosophiques et théologiques de 1928 a 1934; fundador do Institut d'études médiévales, anexo à Universidade de Montreal (em 1932); membro da Société de philosophie, de Lovaina; presidente da Société thomiste; colaborador de numerosas revistas de teologia, filosofia e história; consultor do Secretariado para os não-crentes.

Foi fundador da revista teológica Concilium. Grande especialista em Santo Tomás de Aquino.
Um primeiro olhar aos escritos de Chenu pode dar a impressão de haver um certo dualismo em sua obra: parece que de um lado está o historiador, de outro o teólogo; de um lado, como disse o próprio Chenu em uma conferência a um grupo de seminaristas, parece estar "um velho medievalista de certa fama, imerso na leitura de textos antigos, estofado de erudição, ligado aos velhos séculos da cristandade, em uma tradição que se obstina a manter-se em meio ao mundo contemporâneo; do outro, um jovem que se lança indócil na confusão do mundo contemporâneo, extremamente sensível aos seus apelos, pronto a enfrentar os problemas delicados do mundo e da Igreja. E, por isso, discutido e até mesmo suspeitado junto a certas pessoas". Na realidade, assegura-nos o próprio interessado, há um só e idêntico Chenu; nele, o historiador da idade Média e o teólogo moderno constituem uma só coisa. Foi o historiador que ensinou ao teólogo, a distinguir nas coisas, aquilo que é perene daquilo que é mutável, e que o tornou sensível aos sinais dos tempos. Somente um profundo conhecedor da história da Igreja, da humanidade e da teologia, poderia delinear as soluções que ele elaborou para os difíceis problemas da natureza e das tarefas da teologia, da missão da Igreja no momento presente, do valor da matéria, das realidades terrestres, do trabalho, da socialização e de outros aspectos típicos do nosso tempo.


A produção de Chenu no campo especulativo não é muito vasta. Ele excluiu conscientemente a hipótese de reescrever a teologia do início ao fim, como se tudo o que foi feito pelos teólogos do passado carecesse de valor. Chenu não compartilha o parecer daqueles que consideram a teologia de nossos antepassados como totalmente envelhecida e morta. Segundo ele, no que se refere a certos problemas, ela pronunciou uma palavra que vale para sempre e cunhou uma linguagem teológica que não é defeituosa nem incompreensível. Ao contrário, ele fez ver que a teologia medieval possui um repertório lingtiístico inexaurível, além de doutrinas de valor perene. Chenu não concebe a teologia como uma empresa individual, que cada qual pode tentar por conta própria, mas sim como um trabalho da Igreja inteira, um trabalho que se realiza lenta e continuamente, através da obra dos teólogos em particular. Coerente com essa concepção, ele assumiu a tarefa de ampliar o saber teológico em algumas direções ainda inexploradas, mas de capital importância, dada a situação em que se debate atualmente a humanidade. E, assim, enfrentou os problemas do valor da matéria, do trabalho, da socialização, das tarefas do laicato, da natureza da teologia. E foi nesses pontos que sua contribuição ao desenvolvimento da teologia tomou-se determinante.


PENSAMENTOS DE DOMINIQUE CHENU

"Dado que a palavra de Deus se exprimiu em linguagem humana, moldando-se às palavras, frases, imagens, estrutura, géneros literários da palavra humana, essa ‘escrita divina’ encontrará as suas vias de inteligibilidade através da interpretação das palavras, das frases, das figuras, dos géneros literários da linguagem humana."

"Aquilo mesmo mediante o qual a teologia é ciência é aquilo pelo qual ela é mística".

"O cristianismo é sem dúvida, o mistério de Cristo que vive, morre e ressuscita em mim. Porém, como se realizou este mistério? Numa incarnaçao, isto é, numa vinda de Deus no tempo e na história. O cristianismo a partir daí não mais é uma evasão; mas uma recapitulação, segundo a própria expressão de S. Paulo. Um retomar e um recuperar de toda a criatura em Cristo, até à divinização através do homem".

"Historia est magistra vitae: máxima admirável que condensa, ao mesmo tempo, uma experiência milenar e um princípio de elevada cultura. É urgente que, contra as reivindicações infantis de uma espontaneidade que se afirma a única criadora, se medite sobre as lições e as leis da História (...). O enraizamento inteligente no passado é a garantia da projecção do futuro; o presente não é mais que o ponto nevrálgico desta dialética."

"Por causa de um errado sobrenaturalismo, alguns teólogos – católicos e protestantes, estes em maior numero – dividiram a realidade ao reduzir a profissão à natureza para enaltecer a vocação com a graça".

"O fato social humano não permanece exterior à incarnaçao, é até o lugar privilegiado da consumaçao da incarnaçao. A humanidade é uma expressao muito simples, porém, vejamo-la em toda a sua força: a humanidade é o corpo místico de Cristo e a entrada na posse do mundo pela qual o homem realiza o destino de toda a criatura, marca, nas suas etapas económicas, o desenvolvimento místico do empreendimento divino".

"O cristianismo situa-se no tempo vinculando-se assim à história. É uma força histórica na transformaçao do mundo e isto, não sómente em virtude de quaisquer benefícios esporádicos, mas como um fermento que faz levedar a massa. A salvação é sem dúvida pessoal e realiza-se numa comunhão exclusiva e íntima com Deus. Não se pode porém efetuar fora da comunidade humana".

"Deus é a verdade substancial, fim plenificador de todos os meus desejos. Não é um conceito, nem são proposições, nem um sistema de pensamento, mas aquele em quem reconheço agora o todo de minha vida, o objeto deleitável de minha felicidade".

Um comentário:

João disse...

Bom dia, caro Gilberto!

Gostei muito desta publicação sobre Chenu, personagem fascinante do séc. XX. Ouvi falar dele sempre por referências de terceiros, nomeadamente a influência que teve em inúmeros pensadores que o sucederam (até o actual Timothy Radcliffe, antigo Mestre Dominicano, fala como foi tão valioso conhecê-lo e aprender dele).
Poderia sugerir-me alguma obra de Chenu que me permita conhecer melhor o seu pensamento? Talvez não haja muitas traduções para português e o meu francês é fraco... o meu inglês não é mau.
Ou bons textos de outros sobre ele.

Agradeço-lhe e os meus parabéns por este destaque!